Um grupo de sobreviventes do Holocausto lançou um apelo conjunto antes das eleições para o Parlamento Europeu, que decorrem entre 6 e 9 de Junho, em que pede aos jovens eleitores que evitem partidos de extrema-direita e que votem para proteger a democracia. A carta foi publicada pelo grupo de direitos humanos Avaaz, que tem apelado a uma maior participação dos eleitores nas urnas, e assinada por oito homens e mulheres que têm entre 81 e 102 anos. “Para milhões de vós, as eleições europeias são as primeiras eleições das vossas vidas. Para muitos de nós, poderá ser a última”, escreveram os autores da carta, apresentada em Berlim na terça-feira.
O documento é dirigido aos “netos e netas” dos sobreviventes, aos “eleitores de primeira viagem e a todos os democratas” e traça um paralelismo entre o clima político actual e o da Alemanha na década de 1930. “A última vez que a direita chegou ao poder, ainda éramos jovens, alguns de nós crianças. Eles prometeram tornar este país grande novamente. Prometeram que os alemães viriam primeiro e encontraram pessoas culpadas por tudo o que não funcionou: os judeus, os Sinti e os Roma, os homossexuais, as pessoas com deficiência, os democratas empenhados. Passo a passo, milhões de pessoas foram privadas dos seus direitos, incluindo o direito à vida”, lê-se na carta.
O grupo de oito sobreviventes escreve também que o Holocausto “não começou com campos de concentração” e que a extrema-direita “não chegou ao poder através de um golpe, mas sim através de meios democráticos”. “Naquela altura houve um desenvolvimento semelhante ao que existe hoje: um governo democrático fraco e um partido que reuniu as pessoas que estavam insatisfeitas”, refere Walter Frankenstein, de 99 anos, num comunicado citado pela AFP. “Não podíamos evitar [a ascensão do nazismo] naquela altura, mas vocês agora podem. É por isso que os jovens de hoje não podem simplesmente dizer ‘não sei em quem votar, por isso prefiro não ir.’ É a pior coisa que podem fazer. A nossa democracia deve ser defendida continuamente”.
Ruth Winkelmann, que se escondeu dos nazis com a mãe e a irmã numa barraca de jardim durante mais de dois anos, depois de o pai ter sido deportado para o campo de concentração de Auschwitz, disse que assinou a carta porque a AfD, que deverá obter cerca de 15% das votações na Alemanha nas Europeias, “está a tornar-se demasiado forte” e tem “muito em comum” com os nazis da década de 1930. “Como democrata, devemos reconhecer toda a gente, sejam verdes, brancos ou negros, não importa. Sejam baixos ou altos, podemos viver em conjunto e ter respeito por todos”, disse.
Também Eva Umlauf, cujo livro de memórias The Number on Your Forearm Is Blue Like Your Eyes será publicado em inglês a 20 de Junho, disse que o aumento da popularidade da AfD na Alemanha, onde 64,9 milhões de pessoas compõem a maior proporção de eleitores de qualquer país, fez com que estas eleições se tornassem mais importantes do que qualquer outra.
“Se olharmos para o programa da AfD, a forma como são contra as mulheres, estrangeiros, judeus, e como participaram numa conferência de remigração para se livrar dos estrangeiros na Alemanha, como os seus apoiantes apregoam os slogans nazis… Existem claros paralelos com o passado. Nas redes sociais, estes partidos são muito activos em canais que tentam atrair os jovens, como Hitler e o seu ministro da Propaganda, Joseph Goebbels, o fizeram de forma eficaz e com muito menos meios”, referiu a mulher de 81 anos.
Cerca de 373 milhões de cidadãos dos 27 Estados-membros da União Europeia podem votar de 6 a 9 de Junho na composição do Parlamento Europeu, que apostou numa campanha, com um orçamento de 33 milhões de euros, que também apontou o dedo aos jovens e deixou uma mensagem “de avós para netos”. O vídeo, que já foi visto mais de 190 milhões de vezes, inclui testemunhos de idosos europeus que pedem aos mais novos que “usem o seu voto” e não deixem ninguém “decidir por eles”.