Depois do sucesso no Brasil das obras Quem Tem Medo do Feminismo Negro? ou Pequeno Manual Antirracista, a escritora, académica e activista brasileira Djamila Ribeiro recebeu como missão, encomendada pelo seu editor, escrever um novo livro relacionado com o tema da maternidade. Quando se sentou para o escrever, as primeiras 32 páginas de Cartas Para Minha Avó saíram-lhe de rajada.
“Este livro se impôs a mim de alguma maneira”, contou já por diversas vezes a mestre em Filosofia Política que nasceu em Santos, em 1980, filha de um estivador comunista e de uma dona de casa com ligações ao candomblé e que antes de se formar em Filosofia, quando já era mãe, passou pelo curso de jornalismo.
No entanto, estas memórias onde conta detalhes da sua infância e da sua adolescência, como o luto e o trauma da morte da mãe um ano depois da morte do pai, ou a sua forte ligação com a avó Antónia, benzedeira que era conhecedora do poder curativo das plantas, e de cuja vida gostaria de ter sabido mais quando ela era viva, carregam o resultado de um processo que lhe custou muito. Por várias vezes teve de se afastar do livro, que lhe foi profundamente doloroso. No entanto, esta é a obra que mais gostou de escrever.
“Enquanto escrevia essas cartas para você, meu irmão Denis, o mais velho, me enviou uma foto sua, vó. Você estava toda altiva, usando roupas brancas e com um turbante na cabeça. Fiquei observando cada detalhe da imagem, me demorei imaginando quais histórias havia por trás das rugas em seu rosto, quantas vidas tinham sido afectadas por aquelas mãos calejadas que curavam cobreiros e davam esperança aos que foram benzidos. Mas nada me chamou mais atenção do que seus olhos. Um olhar penetrante, forte e, de novo, altivo. Minha mãe carregava o mesmo olhar, apesar de ele ter sido encurvado pelo tempo”, lê-se nas suas páginas.
Cartas Para Minha Avó, que foi lançado no Brasil pela Companhia das Letras em 2021, é o primeiro livro de Djamila Ribeiro a ser publicado em Portugal, numa edição da Editorial Caminho lançada em Abril deste ano. Estará no centro da discussão do Encontro de Leituras, o clube de leitura do PÙBLICO e da revista brasileira Quatro Cinco Um, na próxima terça-feira, dia 11. A sessão acontecerá às 22h em Lisboa (18h em Brasília) no Zoom, como habitualmente, aberta a todos. A ID é a 821 5605 8496 e a senha de acesso 719623. As jornalistas Isabel Coutinho e Adriana Ferreira Silva apresentam o evento. Entre na reunião Zoom através do link.
“Foi importante entrar em contacto com (e reconhecer) esse feminino na minha família. São quatro mulheres negras em diálogo — eu, minha mãe, minha avó e minha filha —, trazendo esse lugar da valorização desse cuidado, que não é reconhecido na nossa sociedade. Coloco essas mulheres em um lugar de protagonismo na construção das nossas famílias”, explicou Djamila Ribeiro, em 2022, à Quatro Cinco Um.